sexta-feira, 30 de abril de 2010

Crônica/09



Na beira daquela janela

Lá está ele de novo, o danado. Sempre que estou em casa, eu olho para fora. Os olhos buscam a imagem dele naquela janela mais alta.
Às vezes, ele parece olhar a vista, às vezes, está atento para o que acontece dentro do apartamento mesmo.
Ele se espreguiça, cochila ou simplesmente fica lá, parado. Tarde da noite, ele não dorme e nem eu, então, por um momento, nossos caminhos se cruzam de alguma forma. Insones na noite carioca – temos algo em comum, afinal.
Mas o que me mata é nossa diferença. E é singular mesmo. Somos diferentes em muitos aspectos, entretanto somente um deles me incomoda.
Eu estou no segundo andar do prédio onde moro; ele está no sexto andar do prédio vizinho, deitado no parapeito, tranqüilo na beira daquela janela. Eu tenho medo de altura, ele não.
Ele não deve ter sequer a consciência do que significa medo de altura; tem apenas o instinto de que deve se equilibrar. E ele sabe fazer isso. Não tem vertigens como eu, então essa tarefa fica menos difícil.
Aqui do segundo andar, eu o observo, admirada. Ele não me nota, nem sabe que eu existo e muito menos que eu o invejo.
Quem me dera não ter medo de altura. Quem me dera poder ter sido artista de circo, daquelas que andam na corda bamba e que voam e se contorcem pelos ares. Ou perna de pau. Ou alpinista. Mas meu corpo teima em ficar no chão quando poderia estar no alto. Só minha imaginação é que não tem medo de altura. Sabe até bater asas! Mas há dias em que isso não me é suficiente.
Lá de cima, parece que ele me olha, porém eu sei que é só uma impressão. Ainda que olhasse, não faria diferença. Eu não poderia lhe dar um tchauzinho esperando outro. E mesmo que o fizesse, o máximo que teria como resposta seria um olhar blasé, do tipo que só um gato consegue dar.

Imagem: "Mulher na janela", de Salvador Dali. Fonte: Urbanidades da Madeira.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Crônica/08



Eu, leitora e escritora

Certo dia, quando ainda morava com minha mãe, tive uma súbita vontade de pedir a ela que lesse para mim. Estava com sono, mas não conseguia dormir. Ela estava na sala, com visita, fato este que minou minha coragem para solicitá-la. O outro motivo que me impedia de perguntar era a vergonha mesmo. Vergonha terrível. Senti-me paralisada por ela. Como se não tivesse cabimento alguém com mais de vinte anos pedir que a mãe lesse para conseguir pregar os olhos. Como se fosse bobo demais. Ora, não existe idade para se querer um pouquinho de atenção da mãe, não é verdade?
Minha mãe lia para mim. Na verdade, as lembranças que tenho disso são inexistentes, minha mãe foi quem me contou sobre as sessões de leitura. O que me lembro mesmo é de estar sempre cercada de livros. E, se minha mãe lia mesmo para mim, como disse, acredito que este fator contribuiu – e muito! – para que eu me apaixonasse pelo mundo das palavras, pela leitura, tomasse gosto de escrever e deixasse a imaginação fluir leve.
Aos quatro anos era comum que eu estivesse na casa da Júlia, que cuidava de mim enquanto meus pais trabalhavam. Uma das filhas dela, Patrícia, já sabia ler. Era deslumbrante, hipnotizador, vê-la juntando sílabas, pronunciando todas aquelas frases. Queria tanto aprender a ler também! Quanto eu pegava algum livro, tentava logo fazer associações. Se via figuras, imaginava histórias que tivessem a ver com elas. Se não existiam imagens, ficava inventando qualquer coisa, fingindo que sabia o que estava escrito.
A espera para adentrar de vez no mundo mágico das palavras não demorou tanto: aprendi a ler aos cinco anos. Lia tudo que podia, embora não entendesse muita coisa. Adorava outdoors, até decorava as frases das propagandas e ficava recitando para quem pudesse ouvir. As pessoas achavam (ou fingiam achar!) uma gracinha. Minha mãe me incentivava, me deixando pegar os livros que quisesse em casa. Até hoje esses livros existem. Alguns estão caindo aos pedaços, outros estão riscados. Não bastava só lê-los, também tinha que treinar minhas letras tortas, meus primeiros escritos.
Quando estava com dez anos, meu pai comprou para mim uma enciclopédia. Era simples, o conteúdo de pesquisa era até o ensino fundamental e ainda possuía um pequeno fascículo. O gosto que eu tinha pela leitura só aumentava. Comecei a levar a enciclopédia a todos os lugares em que ia. As biografias de figuras célebres logo me chamaram atenção. Li todas, desde Aleijando até Zumbi, passando por Camões e Nereu Ramos. Lembro pouco ou quase nada da história desses personagens, mas enriqueci meu vocabulário e isso me ajudou bastante.
Conservei-me assim até o final da oitava série. Meu lugar na hora do recreio era sempre a biblioteca. Tia Lourdinha era a bibliotecária mais simpática do mundo. Eu me perdia entre os volumes da série Vagalume e entre revistas antigas.
Dos quinze aos vinte anos, relaxei. As leituras tornaram-se mais esporádicas. Em compensação, o hábito de escrever cresceu. Recebia boas notas e elas já me valiam como elogio. Diziam que o que eu escrevia era bom, interessante. Passei a questionar se poderia seguir isso como profissão.
Hoje, retomei as leituras. E já há algum tempo, decidi finalmente “o que quero ser quando crescer”: escritora.
Num país onde o índice de analfabetismo ainda é alto e onde a maior parte das pessoas alfabetizadas não possui o costume de ler, talvez soe meio insano afirmar minha futura condição.
Não me importo. É maior do que eu! Aliás, até me parece errôneo dizer que serei uma escritora. Verdade é que já sou; amadora, ainda, mas sou. Penso em concluir a faculdade de Jornalismo, sim. E imagino que um trabalho nessa área poderá pagar minhas contas. Paralelamente, me dedicarei também àquilo que nasci para fazer: escrever. Será meu bel prazer. E, quem sabe um dia, possa ser meu sustento. Mas nada de satisfação transformada em suplício. Quero apenas continuar esbanjando letras e nada mais.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Crônica/07



O riso

O riso é algo tão natural quanto o choro e a tristeza. Está presente no nosso dia a dia, através de várias situações. Não importa se estamos num trânsito caótico ou numa lanchonete com os amigos – o riso sempre estará no ar, ainda que seja forçado ou irônico.
Apesar de ser uma coisa simples, o riso também tem um que de contraditório: o que é motivo de risada para alguns, pode não ser para outros.
De um jeito ou de outro, está comprovado cientificamente: rir só faz bem. Quem ri bastante, é mais saudável e é considerado alguém mais simpático, além de ser mais requisitado como companhia.
Não que você tenha que sair por aí distribuindo sorrisos, não é isso. Mas é certo que em várias ocasiões, como numa compra na padaria da esquina, sorrir é bem visto por todos ao seu redor. Em situações constrangedoras, rir, quase sempre, costuma ser o melhor remédio. Bem melhor que chorar, se chatear ou ficar se torturando pelo que houve – seja lá o que for, poderia ter sido com qualquer outra pessoa.
Mesmo que você não tenha assim tantos motivos ou seu sorriso não seja exatamente de uma top model, se esforce para rir ao máximo.
Se não conseguir, apele. Cerque-se de pessoas sorridentes, assista a filmes de comédia, vá a um circo! Enfim, faça de tudo para não se tornar uma daquelas pessoas carrancudas e rabugentas.
O riso é algo bastante antigo, mas que nunca deveria sair de moda. É ou não é? Hahaha!

Fonte da imagem: Blog do Eddson

terça-feira, 27 de abril de 2010

Crônica/06



Quando ele viaja

Uma hora qualquer, a gente sabe que ele vai viajar. Ele sempre viaja, ontem mesmo eu o vi debandar novamente. E assim, meu casamento segue um ritmo peculiar: ele fica três meses em casa, dois fora, um em casa, vinte dias fora. Eu fico no Rio e, quando dá, vou encontrá-lo, seja lá onde ele estiver.
Essas viagens fazem um bem danado. Não só pela questão de sair de casa, ver outras paisagens, mas também para o casamento em si. Eu nunca almejei um casamento com o tédio de ver tv, com a poeira da rotina, com a gente ouvindo os passos do dia a dia. Na verdade, quando a gente decidiu morar junto, ele já sabia de certa forma o script que estava por vir - ele já foi casado; eu, não – só imaginava. Portanto, pensei, estava na hora de saber como era, afinal, conviver debaixo do mesmo teto e com todas as questões que isso envolve.
No começo, tudo era novidade. Hoje, eu já sei o que amo e odeio nesse “roteiro” todo e sei também o que amo e odeio – ao mesmo tempo. Eu amo e odeio, por exemplo, quando ele viaja.
Quando ele viaja é sempre uma coisa estranha: eu me sinto, ao mesmo tempo, contente e triste. Fico contente porque preciso de solidão, preciso de silêncio, da tv desligada, da cama só para mim – coisa gostosa é poder me espreguiçar, ocupar o espaço todo, ainda que eu tenha só 1,52m!; e me sinto triste porque preciso de companhia, preciso de barulho, da tv ligada no noticiário matinal, dele tentando tomar meu espaço na cama.
Quando ele viaja, eu comemoro – algo como a performance cinematográfica de Tom Cruise em “Negócio Arriscado”. Para quem nunca viu o filme: o personagem de Cruise fica sozinho em casa (os pais viajam) e a primeira coisa que faz é dançar rock ‘n roll de cueca na sala de estar. Diga-se de passagem, amo a música que eles colocaram nessa cena.
Mas voltando ao assunto: quando ele viaja, fico quanto tempo agüentar no computador, sem que ele diga que quer atenção; escrevo meus textos sem que ele me interrompa o raciocínio, posso deixar a louça acumulada sem ouvir reclamações; deixo meus papéis espalhados pela cama e pelo chão e leio sossegada.
Mas essa é a parte boa. Quando ele viaja, eu também sinto falta dos almoços (ele sempre cozinha, eu prefiro lavar a louça); sinto falta da companhia, dos beijos, do carinho, dos abraços apertados, do café forte, dele dançando e cantando e querendo cafuné, e, claro, sinto falta de... outras coisas mais, haha.
Hoje, ele viajou e eu estou há horas imersa em quietude – nem tv nem música – só o barulho do ventilador e das teclas do Velho Guerreiro, meu pc. Estou escrevendo há horas e não faço idéia de quando vou parar. E agora a pouco, de repente, o pensamento fugiu do texto e eu me indaguei: será que ele conseguiu dormir no ônibus?
Toda vez que ele parte, eu sinto uma espécie de vazio e, paralelamente, me sinto cheia de alegria. Não só por conta de tudo que já mencionei, mas também porque imagino como será quando ele voltar. Ah, o dia do retorno... É sempre uma das partes mais bacanas de quando ele viaja.

Fonte da imagem: Cinie's World.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Poesia/26



Você matou minha formosura
Me deu mais cinqüenta rugas
Esticava nossas rusgas
Delas fazia serão
Até que eu desisti
De querer sua atenção
Você se pôs a rir
Duvidou do que eu disse
Como queria que eu sentisse
O mesmo amor de outrora?
Agora, gasto minhas horas
Te evitando a qualquer custo
Não sei até quando
Meu pensamento será seu
Mas tenho a certeza de que estou melhor assim
Sem receber seu fel.


Fonte da imagem: Blog da Loiana

domingo, 25 de abril de 2010

Conto/05



Do mar

Desde criança, Ana amava o mar. Gostava de brincar entre as ondas, não se incomodava com a água salgada e não tinha medo das marés. Também conseguia ficar por horas admirando-o, quieta, como se estivesse hipnotizada. O mar sabia desse amor, gostava de se sentir amado, mas se limitava apenas a observar. Era preciso que os pais de Ana viessem chamá-la para voltar para casa. Às vezes, a mãe ficava preocupada. Dizia ao pai:
- Essa menina, não sei não. Uma hora, entra no mar, fica lá dentro que nem uma boba e a maré acaba levando. As irmãs dela não são assim...
O pai, pescador, achava bobagem:
- Isso é só implicância sua. Deixa a menina! Se ela gosta tanto assim do mar, pode gostar dos peixes também e trabalhar comigo um dia.
Então, Ana cresceu. E o amor pelo mar permaneceu intacto. Começou a trabalhar com o pai, ajudando a carregar o balaio com os peixes. A carga era pesada, mas Ana não se importava. Em troca, o pai às vezes a levava nas pescarias. Ela tinha que acordar cedinho, tinha que ajudar a carregar as redes e fazia tudo sem reclamar. O pai achava que era um trabalho pesado para ela, porém precisava de ajuda e esse era o preço que cobrava a ela por querer ficar por algumas horas em alto mar.
Ana era moça bonita e começou a chamar a atenção dos rapazes do lugar. Não demorou muito para que um deles se tornasse seu namorado e depois seu marido. Aprovado pela família, pescador conhecido, era um sujeito trabalhador e também orgulhoso. Não queria que a esposa ajudasse na pesca, bastava que limpasse os peixes. Ana aceitou. Sabia que o marido não fazia isso para mantê-la afastada do mar, e sim porque achava que aquele era um serviço só dele. E continuava fazendo suas visitas. O mar se alegrava em vê-la, apesar de saber que ela agora era uma moça casada.
As visitas, sempre longas, passaram a ser motivo de reclamação do marido. Ana teve um filho, o marido lhe fazia cobranças:
- Por que ainda não arrumou a casa? Por que as panelas ainda estão sujas? Por que diabos o bebê estava na praia com você?
E ela ouvia calada. Como poderia dizer que precisava, que necessitava ver o mar? Como poderia argumentar que perdia a hora enquanto estava diante dele?
O marido passou a desconfiar, pensou que ela tinha um amante e começou a vigiá-la. Entretanto, sempre a via sozinha ou com o filho e percebeu que não existia outro homem. Ele se indagava: “Se não é um amante, o que será?”
E assim, os dias passaram. E logo, foram-se meses. Antes calada, Ana agora discutia com o marido. Dizia:
- Preciso ver o mar. Eu apenas não quero deixar de estar mais perto dele.
O marido achava a maior bobagem do mundo. Como uma mulher poderia se esquecer da vida que tinha para ficar admirando o mar? Para ele, era sinal de demência. E não sabia o que poderia ser pior: a suposição de antes, de que ela pudesse ter um amante, ou a idéia de que fosse louca.
Logo, a família de Ana ficou a par das brigas do casal. Não é possível esconder coisas assim por muito tempo. A mãe recomendava:
- Aprenda a ficar dentro de casa. Dê essa satisfação ao seu marido. Ele gosta tanto de você, não deixa faltar nada a vocês...
Até o pai se intrometeu:
- Eu nunca liguei para essa sua coisa de querer estar sempre perto do mar. E agora a situação está do jeito que está... Você tem que cuidar do seu casamento, minha filha. Seu marido pensava que você tinha um amante, que vergonha! E agora que viu que não era nada disso, pensa que você é maluca!
Ana tentou. Prometeu ao marido que as visitas iriam acabar. Enquanto isso, o mar sentia saudade daquele amor todo; amor que, afinal, era recíproco. À noite, começou a mandar recados pelo vento, dizendo que queria vê-la. E Ana ficava aflita, pois não podia ir, estava tentando salvar o casamento, levar a vida adiante. Então, noite após noite, ela começou a dormir mal, a ter pesadelos. Neles, ela era um dos peixes pescados pelo marido. Ele olhava satisfeito para aquela Ana transformada em peixe e dizia: “Esse deu trabalho, mas é dos bons”. E ela tentava pular, mas o marido a segurava. O esforço era vão, o sonho acabava da mesma forma: ela sempre era um peixe pescado e sempre acabava na panela, preparada por uma esposa que tinha seu rosto e seu corpo, mas não tinha sua alma.
Um dia, sonhou diferente. No sonho, nadava livre pelo mar, pertencia naturalmente a ele e nunca tinha se sentido tão feliz; nem no dia de seu casamento estivera tão contente assim. Acordou leve e não teve dúvidas: deixou o filho com a mãe e foi até a praia. O sonho era um sinal de que só perto do mar conseguiria se sentir bem.
O marido tinha ido à cidade, mas não tardou em voltar para casa. Não encontrou ninguém e logo suspeitou que Ana estivesse na praia. Foi atrás dela – e chegou tarde demais.
Na praia, o mar sussurrava todas as juras de amor guardadas. Ele estava feliz por voltar a vê-la, queria abraçá-la, queria ficar com ela para sempre. E Ana afirmou que, se correspondesse, aquilo significaria o fim do seu casamento. O mar ouviu, atento, e não teve mais dúvidas: pediu que ela se aproximasse.
Enquanto ela adentrava na água, o marido corria até a beira do mar. “Ana!”, gritava desesperado. Ela já não podia ouvi-lo, mesmo que em pouco tempo ele também estivesse já na água, nadando para alcançá-la. Aos poucos, ele notou, aterrorizado, que a mulher se transformava diante de seus olhos. Pensou que ela estivesse se afogando, até que as pernas sumiram e deram lugar a uma longa cauda de peixe. Ela jogou o vestido ao mar, enquanto seus braços e mãos logo se encheram de escamas. Os cabelos se ondularam ainda mais e logo as conchas o enfeitavam. E ele pôde ver quando o mar a envolveu e a beijou.
Ana se sentia feliz como em seu último sonho. Soubera desde cedo que era do mar e, que agora, ele decidira buscá-la. Ao longe, pareceu ter ouvido alguém chamar, mas o barulho das ondas abafou qualquer som que pudesse impedi-la de mergulhar para sempre dentro do oceano.


Fonte da imagem: Blog Janela da Minha Rua

sábado, 24 de abril de 2010

Poesia/25



Teus pés junto aos meus
Se embaralham, se misturam
E não é culpa do breu.


Fonte da imagem: Blog Liricando

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Poesia/24



Te entreguei meu coração
Em troca tive paixão
Teu preço era caro
Teu prazer era tão raro
Que me encheu de cor

Foram noites enlaçados
Lua, sol, tempo parado
E tu sempre tão calada

Eu não quis perguntar
Tu não quiseste responder
Acabou por não dizer
O que ia aí dentro
E uma noite o pensamento
Tomou força maior

Tu não tiveste dó
E me deixaste sozinho
E ainda é assim que vivo:
Esperando por uma dama que até hoje
Não foi minha.


(Fonte da imagem: Blog Textos Inteligentes)

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Poesia/23

Lá vem você pisando macio
Você me beija e eu me arrepio
Agora a raiva está por um fio
Seu corpo bem sabe que me deixa no cio...

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Poesia/22



Poeminha bem simples para Brasília, que hoje completa 50 anos.

O presidente Juscelino
Um dia sonhou acordado
"Creio que nossa capital
poderia ter sede em outro estado!
No interior, com certeza
Uma cidade projetada
Que trará muita beleza
Ao cerrado da minha pátria amada"
.
Ele cumpriu seu intento
Um sonho se realizou
A cidade foi construída
Com muito esforço e louvor
Ele transferiu a capital
Brasília estava erguida
Longe do litoral gerou empregos
E se tornou nossa capital querida
Meio século de existência
Brasília é uma moça crescida
Suas formas, todos sabem
A deixam envaidecida
Seu corpo foi esculpido
Por gente de toda parte
Com a ajuda de Niemeyer e Lúcio Costa
Que projetaram tudo com muita arte
Essa cidade planejada
Deu novo rumo ao país
E agora comemora
Essa data tão feliz!

Fonte da imagem: Independência Sul Americana.

terça-feira, 20 de abril de 2010

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Minitrova/01

Soon
I'll meet
My lover
The Moon.


Tradução:

Logo
Eu encontrarei
Minha amante
A Lua.

domingo, 18 de abril de 2010

Poesia/21

Um dia, a gente deixa de ser criança.
Um dia, a gente deixa de ser jovem.
E para que?
Para se tornar tudo que não queria ser.

sábado, 17 de abril de 2010

Poesia em outras línguas/02



Poetry in others languages/02.

- Oui, messier?
- Je voudrais la lune, s'il vouz plaît.
- Je suis desolée. C'est seulement pour regarder.

Em português:
- Pois não, senhor?
- Eu quero a lua, por favor.
- Sinto muito em lhe dizer. Ela é somente para se ver.

In english:
- Yes, sir.
- Please, bring me the Moon.
- I'm sorry. Don't you prefer I bring a spoon?

(Sorry, but I changed text when I translated to English. And yes, I didn't want to loose a rhyme).

Fonte da imagem: Rodrigo Martinelli Blog

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Microdístico/02

A way?
I will
Go away.


Tradução:

Um caminho?
Eu vou
Embora.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Haicai Guilhermino/01



A ave leve voa
Sozinha no céu azul
Segue à toa.

Fonte da imagem: Blog Eu estou aqui

quarta-feira, 14 de abril de 2010

terça-feira, 13 de abril de 2010

Poesia/20

Hoje a paixão me acordou
Minha boca pedindo a tua
Não via a hora de te encontrar
Fosse na Terra ou na Lua

E agora que estamos aqui
Aproveito toda a tua atenção
Eu vim aqui te ver sorrir
Ao ouvir minha declaração

Deixa eu dizer que te amo
Deixa eu fazer meu cortejo
E tenha dó do meu coração
Não me negue o teu beijo!


[Feliz dia internacional do beijo!! hehe]

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Poesia/19

Felicidade

Passageira ou escondida?
Verdadeira ou só mentira?
Eterna? Moderna? À moda antiga?
Vendida aos montes na tv,
Apenas você não tem.
Há quem diga possuí-la,
Mas será que ela é real?
Pode ser mais uma palavra
Para fazer comercial.
Vai, me vende felicidade!
Ou diga que ela vem.
Diga ter a certeza
De que posso tê-la também.

domingo, 11 de abril de 2010

Crônica/05

Las Vegas, case comigo

Eu confesso: queria me casar.
Mas nada daquela coisa de igreja e cartório. Eu queria me casar só para aproveitar a festa.
E claro que não poderia ser uma festa qualquer. Essa coisa de buffet, vestido de noiva, criança carregando as alianças, nossa eu acho isso muito bonito para as outras pessoas, mas não para mim.
Eu queria me casar bêbada em Las Vegas, com cerimônia oficializada por alguém vestido de Elvis.
Eu entraria cantando e dançando “Viva Las Vegas” e gritaria “Elvis não morreu!”. Meu noivo também estaria bêbado e teria que se casar sentado, pois não conseguiria permanecer de pé.
As testemunhas seriam dois mendigos, um homem com um chapéu de cowboy e uma mulher cheia de tatuagens. É, acho que somente duas seriam necessárias, mas toda festa precisa de convidados, certo?
Melhor ainda se o noivo fosse um desconhecido qualquer, com quem eu teria apostado no cassino: se você perder, nós nos casamos bêbados. Se eu perder, vou tatuar seu nome na minha bunda – ah, quase esqueci: qual é seu nome mesmo?
Depois do casamento, iríamos celebrar jogando uma partida de pôquer próximo a capela. Depois, eu não viraria corista, pois não sei cantar, mas talvez crupiê. Meu marido sumiria pelo mundo. E eu seria feliz para sempre, casada, de fato, com Las Vegas.
Mas a dura realidade é que eu já sou casada. Claro que meu marido não sabe que eu tenho essas idéias. Quer dizer, acho que ele desconfia, pois volta e meia eu falo sobre fugir para Las Vegas e me estrepar no jogo e tudo mais.
Nessas noites, quando falo sobre Las Vegas, ele prudentemente fecha a porta do apartamento e esconde a chave até o dia seguinte. Que bobo... Até parece que não imagina que se eu decidir fugir mesmo basta abrir a janela e usar uma corda feita de lençóis. Ideia simples!
Enquanto isso, Vegas continua me esperando sem nem saber que eu existo. Vegas não sabe que eu fui feita para ela e vice versa, embora eu já seja casada e meu marido talvez não se interesse por Vegas tanto quanto eu. E tem outra coisa que Vegas não sabe: eu daria trabalho aos cassinos, já que paguei minha escola jogando pôker.

Chronicle –
Las Vegas, marry me.

I confess: I’d like to get marriage.
But no church or a civil marriage on a registry office. I would like to marry just because the party.
And, of course, it wouldn’t be a trivial party. Buffet, a big dress, a child carrying the rings, hum, I think everything cute – for other people, but not for me.
I’d like to get marriage drunk, in Las Vegas. Our chaplain would be dressed like Elvis.
I’d come inside chapel singing and dancing “Viva Las Vegas” and I’d scream “Elvis is not dead!”. My fiancé would be drunk too and he would have to marry on a chair because he couldn’t stand up.
For witnesses, we would have two beggars, a man using a cowboy hat and a woman with a lot of tattoos. Yeah, I guess only two buddies would be necessary, but a party needs guests, right?
It would be better if I just didn’t know my fiancé. We would have meet on the casino and we would bet: if you loose, we’ll get drunk and marry; if I loose, I will tattoo your name on my derriere – by purpose, what’s your name?
And after marriage, we would celebrate playing poker near chaplain. Then, I wouldn’t become a singer, because I can’t sing, but maybe a croupier. My husband would disappear traveling around the world. And I would be happy forever, married, in fact, with Las Vegas.
Well, reality is hard: I’m married already. Of course my husband doesn’t know I have these ideas. I mean, I guess he supposes, because sometimes I start to talk about loose money in Las Vegas and etc.
On these nights, when I talk about Vegas, he prudently closes our door and hides key until next morning. What a foolish… It’s like he didn’t know I just could escape through our window, using with a rope made of sheets. A simple idea!
While this, Vegas awaits for me - but it doesn't knows I exist. Vegas doesn't know I was made for it and vice versa. It doesn't matter if I'm already married and my husband it's not interested in Vegas like I'm. Ah, there's one more thing Vegas doesn't know: it would be hard to play cards with me, cause I paid my school playing poker.

sábado, 10 de abril de 2010

Poesia/18

Nada houve

Por que às vezes a gente parece ter tanto assunto e nada sai?
Por que às vezes a gente tem nada a dizer e as palavras caem?
Sim, elas caem
Em forma de pedras, folhas ou pipas
Elas saem
Se jogam da boca como a temer um grande monstro:
O pensamento.
Apressadas, procuram contentamento
Nos olhos de quem as ouve
Mas aquela indiferença toda
Faz parecer que nada houve.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Poesia/17

Quando Fevereiro chegar
Eu vou cair na folia
Beber até virar a perna
Bailar até raiar o dia.

Quando Fevereiro aportar
Eu vou sair da rotina
Ao Carnaval vou me entregar
Festa pagã e divina.

Quando Fevereiro vier
Eu vou tomar licor de lua
Me acompanhe se puder
Dance comigo na rua.

E quando Fevereiro acabar
E toda a pompa for saudade
É hora de se mascarar
E voltar a civilidade.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Crônica/04

Crônica de uma amizade anunciada.
(Para Rogério).

“Je cherche en gémissant”¹. As palavras ecoam por segundos, minutos ou horas, enquanto eu folheio o restante das páginas e me certifico de que sim, o livro está velho, bem velho. Por um momento, eu sinto vergonha por ele estar assim. Quer dizer, não é minha culpa, mas por que afinal eu não comprei um livro novo? Resposta simples: por falta de dinheiro. Resposta confusa: não me lembro, não tenho certeza, não sei. Resposta complexa, baseada na crença em destino: porque eu estava na rua certa, na hora certa, com o dinheiro exato e querendo presentear alguém com uma coisa legal. Qual é a resposta correta? Todas ou nenhuma ou N.D.A², quem sabe. De qualquer forma: folheio o livro todo, colo uma parte da capa e concluo que ele não está velho demais para deixar de ser um presente. O importante são as palavras contidas nele e, claro, a intenção do regalo.

O livro é “O encontro marcado”, de Fernando Sabino. A frase em francês é uma referência a Blaise Pascal e é dita pelo personagem Hugo, numa conversa entre amigos.

Essa cópia foi comprada para Rogério, um amigo virtual. É meu livro favorito, eu gostaria que ele o lesse também – quem sabe surja daí a possibilidade de “puxar uma angústia”³ conversando sobre os personagens. Há tempos esse exemplar comprado na rua está guardado, esperando por um encontro com o dono ou pela minha iniciativa de enviá-lo a ele. No Rio, é comum encontrar pessoas vendendo livros (e outras coisas) nas ruas. Elas fogem ou se escondem quando a fiscalização passa, pois é proibido vender mercadorias a céu aberto, sem nota fiscal, etc etc etc, blablabla.

Da minha parte, encontrar essas pessoas é mais bacana do que qualquer shopping center. Você pode achar do (in)útil ao inusitado. E claro, pode encontrar bons livros a preços bem camaradas.

Então, foi num dia qualquer, eu estava andando por uma rua qualquer e vi o livro e ele também me viu. Ele disse: “Psiu, estou aqui!”. “Eu já o tenho”, pensei, “mas ele vai se tornar um presente”.

É costume meu dar livros de presente, é um atrevimento da minha parte. Dar um livro é uma coisa tão pessoal! Você pode pensar que está acertando ao dar determinado livro, mas não está. E isso acontece até mesmo quando você conhece bem a pessoa. Mesmo sabendo que o presenteado pode não ler ou gostar do que recebeu, eu continuo me atrevendo e acho que vai ser assim por toda a vida.

Rogério virá morar no Rio em alguns dias. Nós marcamos uma cerveja (convenhamos: algumas!) e eu prometi a ele uma festa com confetes, mulatas e um samba escrito por mim e interpretado pela bateria da escola de samba que ele escolher. Será que foi exagero? Após 02 anos e meio, ele deixará de ser virtual. Eu estou levemente nervosa ou nervosamente leve ou os dois. Finalmente será a hora de presenteá-lo.

“Je cherche en gémissant” começou a ecoar e eu comecei a embrulhar “O encontro marcado” junto a outro livro (“O tio que flutuava”, de Moacyr Scliar), para que o todo parecesse um presente mais decente. De repente, a frase sumiu. De repente, eu soube que, no fundo, Rogério já deixou de ser virtual, embora eu nunca tenha apertado sua mão ou lhe dado um abraço. E de repente, outras palavras começaram a ecoar e eu comecei a escrever esta crônica de uma amizade anunciada, mas já existente – para os dois lados, é o que acredito.

¹ Je cherche en gémissant = Eu procuro em gemido.

² N.D.A = Nenhuma das anteriores.

³ “Puxar uma angústia” é umas das grandes expressões de “O encontro marcado”. Seria algo como começar uma conversa acerca de angústia, de um motivo para preocupação, de uma tristeza qualquer. Se você ler, vai saber do que estou falando.


Chronicle of an announced friendship.

“Je cherche en gémissant”¹. These words are making echoes inside my head for seconds, minutes or hours, while I pass through by others pages and make sure that yes, the book is old, too old. For one moment, I feel shamed because it’s this way. I mean, it’s not my fault, but why didn’t I buy a new book? Simple answer: no money enough. Confused answer: I don’t remember, I’m not sure, I don’t know. Complex answer, based on believe in destiny: because I was on the right street, at the right time, with right money and I wanted to give a cool gift for somebody. Which is the right answer? All of them or none of them or N.O.P², who knows. Anyway: I pass my view through all book, fix a part and I conclude it’s not too old to become a present. What is important: words inside it and of course, my purpose.

The book is “O encontro marcado” (I don't know the english name!!), from Fernando Sabino. This french phrase is a reference to Blaise Pascal and is pronounced by Hugo, between friends.

This copy was bought for a Rogério, a virtual friend. It’s my favorite book, I’d like he could read it too – and after this, maybe there was a possibility to “puxar uma angústia”³, start a conversation about personages. This book, bought on the street, is with me long long time, waiting for a meeting with its owner or my initiative of sending it. In Rio, is very common find people selling books (and other things) on the streets. They hide or run when police comes because nobody can sell thins on streets with no fiscal notes, etc etc etc, blablabla.

Personally, I think it’s more interesting and coolest buy things with these people than go to any shopping center. You can find from useful (less) to unwonted. And sure, you can find great books for good prices.

So, it was any day, I was walking through any street and I saw that book and it saw me. It said: “Hey, I’m here!” “I have this book already”, I thought, “but it can become a present”.

I use to give books as gift, it’s a boldness. To give a book is something so personal! You think you’re making the right choice if you give that book, but you’re not. And it happens even when you know well a person. Well, I know people maybe don’t like or read what they received, but I keep my boldness and it’s gonna be like this for all my whole life.

Rogério will live in Rio in a few days. We’ll meet for take a beer (truly: some beers) and I promised him a party with confetti, mulatas and a samba wrote by myself and played by school samba he decides to choose. Is too much? After 02 years and a half, he will not be virtual anymore. Finally it will be time to give his present.

“Je cherche en gémissant” started to make echoes and I started to pack up “O encontro marcado” with another book ("O tio que flutuava", from Moacyr Scliar). I tried to make everything looks a decent gift. Suddenly, phrase disappeared. Suddenly, I knew Rogério was not virtual anymore, even I never shaked his hand or hugged him. And suddenly, others words started to make echoes inside my head and I began to write this chronicle of an announced friendship, friendship which already exists – for both sides, that’s what I believe in.

¹Je cherche en gémissant = I look for it moaning (right? haha).

²N.O.P = In Portuguese, it would be N.D.A – nenhuma das anteriores. In English, I put N.O.P. For me, it’s a good abbreviation for None of previous.

³“Puxar uma angústia” maybe is the biggest saying of the book. It would be something like start a conversation about anguish, about subjective things that worry you sadness or about sadness. If you read “O encontro marcado”, you’ll know what I’m talking about.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Poesia/16



Rio de Janeiro,
Fevereiro e Março
A ti eu dedico
Meu sincero abraço!

Ah, Rio,
Cidade que me acolheu
És maravilhosa
Meu carinho é teu

De braços abertos
Me espera sempre
Seja com chuva forte
Ou com tempo quente


Rio de Janeiro.

Rio tropical
Cidade que me espanta
Apesar das fraquezas
Tua beleza me encanta

Rio, eu me declaro
Já não sei esconder
É claro como teu mar
O meu bem querer.

(As fotos são deste site).

terça-feira, 6 de abril de 2010

Poesia/15

Enquanto o mundo gira
O meu cérebro conspira
Pira e transpira
Pensamentos desalinhados
Eu viva
Meus sonhos parados.


While world spins
My brain conspires
Goes crazy and transpires
My confused thoughts
I’m alive
But my dreams are stopped.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Crônica/03

Chuva

A chuva me fascina desde que me entendo por gente. Não dava outra: quando começava a chover mais forte, eu pedia para sair de casa e me enfiava debaixo de todas as bicas que encontrava, pulava e corria até não poder mais.
Quando minha mãe implicava e não me deixava sair de jeito nenhum, até que não era tão ruim ficar em casa. Mas também só sossegava quando visse a chuva e pudesse senti-la, um pouquinho que fosse. Então, eu ia para a cozinha, para a antesala ou para perto das janelas que ficavam entreabertas.
Sem dúvida, o melhor lugar para se apreciar o espetáculo era a cozinha. Eu sentava no chão frio e me dividia entre dois mundos: dentro e fora, seco e molhado, cotidiano e casual. Era gostosa demais essa mistura! Podia ouvir os barulhos comuns da cozinha e ver a chuva transformar a terra do quintal em lama.
A fascinação não diminuiu com o tempo. Numa noite dessas, fui com um amigo até o ponto de ônibus. Ele comentou que ameaçava chover; eu retruquei que nem me importaria se isso acontecesse, pois queria mesmo tomar um banho de chuva.
E foi o que aconteceu. Assim que ele foi embora, passou um vento forte. Quando atravessei a rua, as primeiras gotas me alcançaram.
No caminho, esqueci a pressa que Deus me deu e aproveitei o quanto pude. Porém, de uma forma diferente de quando eu era criança. Olhei para o céu e ri. Coloquei a língua para fora. Ri de novo e caminhei de olhos fechados. Depois, senti vontade de chorar; não de tristeza, e sim de alegria, como já não chorava há tempos.
Lágrimas e chuva se fundiram. Eu me senti encantada tanto quanto me sentia na infância, mas agora tinha idéia de como chamar isso. Foi esplêndido estar, ao mesmo tempo, embaixo, acima e ao lado da chuva. Aquela água toda pareceu me penetrar e lavar minha alma.
Cheguei em casa com as roupas ensopadas. Logo, troquei-as pelo pijama. Mais tarde, sem conseguir dormir, fui até os fundos da casa. Ainda chovia. Não resisti e coloquei as mãos do lado de fora. Senti a alegria me invadir de novo. Talvez a chuva me pareça assim tão maravilhosa porque me dá uma sensação de harmonia, de calma. É, é isso mesmo: calma.
Minhas mãos debaixo d’água foi o modo que encontrei de me despedir dessa chuva. Adormeci com o barulho dela me ninando nessa noite dominical. Dormi leve, pensando que no dia seguinte, tudo seria melhor.

domingo, 4 de abril de 2010

Conto/04

A mulher mais feliz do mundo

Eu nasci no corpo errado. Passo a maquiagem do meu estojo especial. Essa é a “maquiagem da fé” – costuma funcionar quando eu quero que me achem bonita: eu tenho fé e aí aparece alguém. Mas esse batom aqui não dá, é horrível! Por que eu comprei isso? É melhor um gloss, é mais discreto.
Parece que meus seios estão fora do lugar. Eu pareço fora do lugar!
Não entendo como ele pôde me chamar para sair. Ele é bonito, inteligente, tem um trabalho interessante...
É, eu pareço sem auto estima. Mas isso é culpa da vida. A vida me deixou insegura. Eu pareço uma tonta...
Vou passar um perfume suave. Será que ele vai gostar? E essa calça, não sei não. Me faz parecer sem formas. Próxima roupa.
O que é que ele quer comigo afinal? Uma noite? Uma hora? Será que ele pensa que só porque eu aceitei sair com ele eu sou fácil? Mas ele sabe que eu trabalho no salão, me conheceu lá mesmo. Ele sabe que eu sou uma pessoa honesta – pelo menos eu tento ser. Ele sabe que eu me sustento cortando e pintando cabelos e sabe também que eu não tenho família. Todos me viraram as costas.
Ele sabe quem eu sou, certo? Melhor: o que eu sou. Ele tem consciência, claro que tem. Um homem não pode se enganar assim!
Ai, essa saia é horrível. Não tenho nada para vestir. E essas blusas estampadas, que breguice. Já sei, vou com uma saia longa.
E ele... Ah, que olhos, que pernas, que boca. O sorriso é de um deus. Ele veio só para um corte, depois voltou, outro corte. E começou a vir sempre e puxou conversa comigo. Por que eu fui conversar com ele? É, foi por puro profissionalismo. A gerente diz que para conquistar o cliente tem que ser simpática – "se ele quiser conversar, converse; se não quiser, fique quieta".
Mas ele quis mais do que uma conversa. Quis saber a que horas eu estaria livre, se sairia com ele para um drink e um jantar. Que homem chique: não me chamou para uma cerveja num boteco qualquer. Me chamou para tomar um drink e jantar com ele.
Não, não vou me iludir. Vai ver ele me chamou só para fazer amizade. É isso, ele quer ser meu amigo. É óbvio. É óbvio?
Nossa, como eu estou atrasada! Tomara que ele não fique impaciente e vá embora. Tanto tempo que eu gastei caprichando no visu.

- Oi.
- Oi. Nossa! Você está linda.

Eu não posso com um elogio, ainda mais de um homem desses. Vou morrer! Mas vou morrer feliz.

- Desculpa o atraso. Saí tarde do salão.
- Tudo bem. Vamos pedir um drink?

Eu estou com uma pergunta engasgada. Preciso saber para não cometer erros. Preciso saber o que ele quer comigo.

- Antes de pedir... Eu quero perguntar uma coisa.
- Pode perguntar.
- Você me chamou para sair... Você sabe, não sabe?
- Sei o que?
- Sabe que eu não sou como as outras. Tem gente que se engana, mas eu quero saber se você sabe.
- Sei, por isso chamei você.
- Mas você sabe o que eu sou?

Ele pegou na minha mão. Ai, eu vou ter um troço.

- Eu sei que você é uma moça maravilhosa no corpo de um rapaz. Mas eu não me importo. Quero você assim.

Todas as minhas preocupações se foram. Ele me quer! Eu nem sei direito o que responder. Dou um sorriso e digo:

- Agora, eu sou a mulher mais feliz do mundo.

sábado, 3 de abril de 2010

Poesia em outras línguas/01

Poetry in others languages/01

Um poeminha com locuções em latim :)
A tradução está logo abaixo ;)

A little poetry with latin phrases :)
It's translated, just go down ;)

Nunc est bibendum
Est mirable visu
Nosce te ipsum
Est mirabel dictu
Mutatis mutandis,
Nec plus ultra,
Ne quid nimis.


[Está na hora de beber
Admirável é de se ver
Conhece-te a ti mesmo
Admirável é de se dizer
Mudando o que deve ser mudado
Não mais além
nada em demasia].

[It's time to drink
Admirable to see it
You have to know yourself
Admirable to say it
Changing what has to be changed
Not more than this
Not too much]

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Poesia/14

Choveu

Hoje choveu dentro de mim
Também choveu lá fora
Choveu porque eu sou covarde
E porque tinha que ser assim

Foi uma chuva fina
Tanto a de lá quanto a de cá
Choveu porque foi o fim

Paralelo ao meu alívio
Talvez eu lhe dissesse sim

Mas seria um sim comedido
Foi melhor ele não sair
Foi melhor que a rotina voltasse
Foi melhor que fosse o fim.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Poesia/13

Primeiro de abril

É a perna curta
E o nariz grande
É Pinóquio
Sem o grilo falante

É tremer a voz
Por um simples instante
E dentro do bolso
Tem bilhetinho de amante

É a tarefa mastigada
É o cachorro sem banho
É a verdura cuspida
E debaixo do sofá, o ranho

É gol com a mão
Que não se diz
É um “eu te amo”
Que não é feliz

Foi apenas um drink
Num encontro informal
Eu fumei sem tragar
Pois não seria legal

Ela é necessária?
Me diga você
De quantas mentiras
Precisa para viver.