Tatyana França, aspirante a escritora, decidiu fazer seu próprio projeto literário. Assim, nasceu o Nulla dies sine linea: 09 meses de textos nos mais variados estilos. O desafio foi cumprido: nenhum dia sem postar, de 14 de março a 14 de dezembro de 2010!
quinta-feira, 29 de abril de 2010
Crônica/08
Eu, leitora e escritora
Certo dia, quando ainda morava com minha mãe, tive uma súbita vontade de pedir a ela que lesse para mim. Estava com sono, mas não conseguia dormir. Ela estava na sala, com visita, fato este que minou minha coragem para solicitá-la. O outro motivo que me impedia de perguntar era a vergonha mesmo. Vergonha terrível. Senti-me paralisada por ela. Como se não tivesse cabimento alguém com mais de vinte anos pedir que a mãe lesse para conseguir pregar os olhos. Como se fosse bobo demais. Ora, não existe idade para se querer um pouquinho de atenção da mãe, não é verdade?
Minha mãe lia para mim. Na verdade, as lembranças que tenho disso são inexistentes, minha mãe foi quem me contou sobre as sessões de leitura. O que me lembro mesmo é de estar sempre cercada de livros. E, se minha mãe lia mesmo para mim, como disse, acredito que este fator contribuiu – e muito! – para que eu me apaixonasse pelo mundo das palavras, pela leitura, tomasse gosto de escrever e deixasse a imaginação fluir leve.
Aos quatro anos era comum que eu estivesse na casa da Júlia, que cuidava de mim enquanto meus pais trabalhavam. Uma das filhas dela, Patrícia, já sabia ler. Era deslumbrante, hipnotizador, vê-la juntando sílabas, pronunciando todas aquelas frases. Queria tanto aprender a ler também! Quanto eu pegava algum livro, tentava logo fazer associações. Se via figuras, imaginava histórias que tivessem a ver com elas. Se não existiam imagens, ficava inventando qualquer coisa, fingindo que sabia o que estava escrito.
A espera para adentrar de vez no mundo mágico das palavras não demorou tanto: aprendi a ler aos cinco anos. Lia tudo que podia, embora não entendesse muita coisa. Adorava outdoors, até decorava as frases das propagandas e ficava recitando para quem pudesse ouvir. As pessoas achavam (ou fingiam achar!) uma gracinha. Minha mãe me incentivava, me deixando pegar os livros que quisesse em casa. Até hoje esses livros existem. Alguns estão caindo aos pedaços, outros estão riscados. Não bastava só lê-los, também tinha que treinar minhas letras tortas, meus primeiros escritos.
Quando estava com dez anos, meu pai comprou para mim uma enciclopédia. Era simples, o conteúdo de pesquisa era até o ensino fundamental e ainda possuía um pequeno fascículo. O gosto que eu tinha pela leitura só aumentava. Comecei a levar a enciclopédia a todos os lugares em que ia. As biografias de figuras célebres logo me chamaram atenção. Li todas, desde Aleijando até Zumbi, passando por Camões e Nereu Ramos. Lembro pouco ou quase nada da história desses personagens, mas enriqueci meu vocabulário e isso me ajudou bastante.
Conservei-me assim até o final da oitava série. Meu lugar na hora do recreio era sempre a biblioteca. Tia Lourdinha era a bibliotecária mais simpática do mundo. Eu me perdia entre os volumes da série Vagalume e entre revistas antigas.
Dos quinze aos vinte anos, relaxei. As leituras tornaram-se mais esporádicas. Em compensação, o hábito de escrever cresceu. Recebia boas notas e elas já me valiam como elogio. Diziam que o que eu escrevia era bom, interessante. Passei a questionar se poderia seguir isso como profissão.
Hoje, retomei as leituras. E já há algum tempo, decidi finalmente “o que quero ser quando crescer”: escritora.
Num país onde o índice de analfabetismo ainda é alto e onde a maior parte das pessoas alfabetizadas não possui o costume de ler, talvez soe meio insano afirmar minha futura condição.
Não me importo. É maior do que eu! Aliás, até me parece errôneo dizer que serei uma escritora. Verdade é que já sou; amadora, ainda, mas sou. Penso em concluir a faculdade de Jornalismo, sim. E imagino que um trabalho nessa área poderá pagar minhas contas. Paralelamente, me dedicarei também àquilo que nasci para fazer: escrever. Será meu bel prazer. E, quem sabe um dia, possa ser meu sustento. Mas nada de satisfação transformada em suplício. Quero apenas continuar esbanjando letras e nada mais.
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Um comentário:
E eu,
Amante da leitura
(o que jamais deixarei de ser),
Faço o seguinte apelo:
Não pare de escrever,
Pois não quero parar de ler.
Bjos!
Patrícia
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