segunda-feira, 21 de junho de 2010

Crônica/15

Os invisíveis

Estão em toda parte. São homens, mulheres, idosos e crianças. Alguns não têm os braços, outros não têm as pernas, mas o que todos não têm mesmo é dinheiro.
Conseguiram a proeza que alquimista nenhum jamais realizou: são invisíveis. A verdade é que os enxergamos, mas fingimos não vê-los. Porém, eles teimam em ser vistos, afinal, precisam sobreviver. "Tio, me dá uma esmolinha?" ou "Ei, moço, me dá dez centavos pra comprar o leite do meu filho?". E por aí vai.
Nós olhamos de rabo de olho, pois eles nos incomodam. É duro encarar a miséria. Passamos e pensamos: "Deixa, eu tenho que cuidar de outros, de mim... Vai aparecer quem cuide dele, coitadinho! E aquela senhora... Aposto que também vão arranjar um abrigo para ela". Temos dó, mas não ajudamos.
Aliás, do jeito que as coisas estão, já nem sabemos quem merece ser ajudado ou não. Ninguém quer ser passado para trás, não é mesmo?
Penso que todo mundo merece ajuda. O porém é que todo mundo fica danado quando ajuda alguém e depois descobre que foi enganado. "Porra, dei meu dinheiro para aquele malandro beber cachaça!". Lógico que, cego de raiva, a gente não lembra que pode ter enganado alguém, por um motivo qualquer que fosse, pelo menos uma vez na vida. Que atire a primeira pedra quem nunca mentiu para levar vantagem ou encobrir alguma coisa.
Enquanto isso, os invisíveis se proliferam. Estão nos pontos mais movimentados da cidade, pois é lá que o dinheiro circula. Depois, voltam para os casebres de papelão e plástico. Ou dormem no lugar que lhes é tão familiar: a rua.
Eles não têm, não sabem, não podem. O que vem depois dos verbos é tanta coisa que até pensamos que nossa vida de fazer contas não é tão má assim.

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